Estudos Bíblicos

O amor limitado de Deus – Parte 3

O amor limitado de Deus – Parte 3
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Dando continuidade à série de postagens sobre “O amor limitado de Deus”, dessa vez estaremos abordando a questão a partir do pensamento do grande filósofo medieval…

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Por Fabio Correia (Filósofo Calvinista)

Dando continuidade à série de postagens sobre “O amor limitado de Deus”, dessa vez estaremos abordando a questão a partir do pensamento do grande filósofo medieval Agostinho de Hipona. O debate em torno da questão conceitual do binômio “homem e liberdade” é de vital importância para o esclarecimento desse assunto. Ouso dizer que, não entendendo quem é o homem diante de Deus, não há como avançar nem mais um centímetro na compreensão da Sotereologia Agostiniana/Reformada, portanto, bíblica.

INTRODUÇÃO

Agostinho, ao longo de sua vida, se envolveu em várias controvérsias, por conta de sua aguçada veia apologética. Dentre elas, aquela que foi a mais importante, no que diz respeito à questão da liberdade, foi o embate travado com Pelágio, por volta de 411 a 412, em Cartago. Pelágio era um monge Britânico, eunuco, natural da Irlanda, que se engajou em intenso conflito contra Agostinho, numa questão que envolvia basicamente o problema do livre-arbítrio e da liberdade.

A ANTROPOLOGIA PELAGIANA

Para Pelágio, o homem continuava habilitado, mesmo depois da queda, a fazer o bem se assim desejasse e que não se fazia necessário uma assistência especial da graça de Deus para que o ser humano O obedecesse.

Ele acreditava que o homem estava habilitado para atender a todos os chamados de Deus e quando Ele o convoca a arrepender-se é porque o homem pode fazer isto, por ele só, sem que seja necessário o auxílio da graça divina; caso contrário, Deus não o haveria ordenado, pois não ordena nada que seja impossível.

As principais reivindicações pelagianas estão diretamente relacionadas à sua antropologia, ao seu conceito de homem, como afirma Sprol, fazendo a seguinte observação acerca da antropologia de pelágio:

Pelágio, destituído da ideia do todo orgânico da raça ou da natureza humana, via Adão meramente como um indivíduo isolado; ele não deu a Adão nenhum lugar representativo, logo seus atos não acarretavam consequências além de si mesmo. Em sua visão, o pecado do primeiro homem consistiu de um único e isolado ato de desobediência ao comando divino […]. Esse ato de transgressão único e desculpável não gerou consequências à alma e nem ao corpo de Adão, muito menos à sua posteridade, onde todos se mantém ou caem por si mesmos (SPROL, 2001, p.35).

Fica claro no pensamento pelagiano uma visão positiva acerca do homem e isso influencia todo o restante da sua construção intelectual. Para ele a queda do homem não trouxe para si uma repentina destruição, muito menos ainda para sua descendência, como denuncia o próprio Agostinho:

O homem pelagiano goza de perfeito equilíbrio moral. O pecado não atinge sua natureza, mas seu mérito. Quando peca, torna-se culpável de sua má ação. Perdoado volta à sua perfeição. Não é prisioneiro de uma inclinação mórbida para o mal (AGOSTINHO. A graça, 1999. p.105).

A ANTROPOLOGIA AGOSTINIANA

Agostinho discordava de Pelágio essencialmente quanto à sua antropologia, de tal forma que as outras discórdias adviam dessa.

Diferentemente de Pelágio, Agostinho entendia que a queda trouxe consequências extremante severas para o primeiro homem; e não somente para ele mas também para toda sua descendência. Ele não o via como um indivíduo isolado mas, essencialmente, como o representante legal de toda a raça humana, como afirma: “Deus, autor das naturezas, não dos vícios, criou o homem reto; mas o homem, depravando-se, por sua própria vontade, e justamente condenado, gerou seres desordenados e condenados (De Civ. Dei, XI, 27).

Para Agostinho, com a queda, em certo sentido, veio também uma privação da liberdade, isto é, o homem que outrora não tendia nem para o bem nem para o mal, depois da queda, adquiriu certa tendência para o mal, passando a conviver com uma natureza pecaminosa que passa a seus herdeiros de forma hereditária, ou seja, essa natureza passa a habitar no homem, coisa que inicialmente não existia. A morte física vem também ao homem depois e só depois da queda e como consequência dela.

Agostinho afirma de forma bastante clara que o pecado corrompeu a natureza humana, criada por Deus, sem vicio nenhum, e não somente seu mérito, como pensava Pelágio. Esse ponto de seu pensamento é essencial para entendermos sua antropologia. Devemos ficar atentos para seu pensamento de que o homem foi criado com uma natureza boa, sem nenhuma propensão ao mal, ao pecado e que esta natureza foi, de fato, modificada, acrescentada, depois da queda com uma mórbida tendência à concupiscência, como afirma,

A natureza do homem foi criada no princípio sem culpa e sem vício. Mas a atual natureza, com a qual todos vêm ao mundo como descendentes de Adão, tem agora necessidade de médico devido a não gozar de saúde. O somo Deus é o criador e autor de todos os bens que ele possui em sua constituição: vida, sentidos e inteligência. O vício, no entanto, que cobre de trevas e enfraquece os bens naturais, a ponto de necessitar de iluminação e de cura, não foi perpetrado pelo seu criador, ao qual não cabe culpa alguma. Sua fonte é o pecado original que foi cometido por livre vontade do homem. Por isso, a natureza sujeita ao castigo atrai com justiça a condenação (AGOSTINHO. A trindade, 1995, XIV, 15).

E ainda:

A alma não pode conceder a si mesma a justiça que uma vez recebida não mais a possui. Recebeu-a quando foi feita criatura humana e perdeu-a, em consequência do pecado (AGOSTINHO. A graça, 1999. p.114).

Podemos resumir o entendimento de agostinho acerca do homem em quatro fases distintas:

a) Capacidade para pecar, capacidade para não pecar (posse peccare, posse non peccare);

b) Incapacidade para não pecar (non posse non peccare);

c) Capacidade para não pecar (posse non peccare);

d) Incapacidade para pecar (non posse peccare).

O primeiro estado corresponde ao estado do homem na inocência, antes da Queda; o segundo estado do homem natural após a Queda; o terceiro estado do homem regenerado; e o quarto do homem glorificado.

A capacidade original do homem incluía tanto o poder para não pecar como o poder para pecar ( posse non peccare et posse peccare ). No pecado original de Adão, o homem perdeu o posse non peccare (o pode para não pecar) e reteve o posse peccare (o poder para pecar) – o qual ele continua a exercer. Na concretização da graça, o homem terá o posse peccare retirado e receberá o mais alto de todos, o poder para não ser capaz de pecar, non posse peccare (AGOSTINHO. Correction and Grace, XXXIII ).

Aqui está a chave para o entendimento da antropologia Agostiniana, que influencia sua visão de moralidade e da ética.

Como fica claro, Deus, em sua essência bondosa, criou o homem bom e perfeito e lhe dotou da maior dádiva de todas, só concedida ao homem: a liberdade, que é, em si, essencialmente boa. De sorte que o homem, no estado pré-queda é absolutamente livre, não tendendo nem mesmo para o bem, podendo escolher, sem nada que o sugestione, o bem e a felicidade eterna. Contudo, com a possibilidade de escolher o mal, a desobediência. Do contrário, onde estaria a liberdade?

Podendo ele escolher o bem, resolve deliberadamente escolher o mal. Acaso haveria culpa em Deus por ter concedido dádiva tamanha, tendo, inclusive, advertido o primeiro homem do perigo e consequências da desobediência? Caindo o homem, trouxe sobre si e sobre aqueles que representava legalmente, todos os males existentes, tornando-se não somente vítima de si mesmo, mas também merecedor e único causador de todos os males que lhe sobrevém, sendo sua culpa transmitida e imputada a todos os seus descendentes, que já nascem pecadores e que, por sua natureza amante do pecado, tem prazer no pecado. Segue-se, então, o plano redentivo de Deus para resgatar alguns homens e trazê-los de volta à felicidade, só que, dessa vez, no seu último estágio, sem a possibilidade de cair novamente.

Proximo ponto: A CONSEQUÊNCIA LÓGICA DA ANTROPOLOGIA AGOSTINIANA: A PREDESTINAÇÃO. Aguarde!

Fonte: Filosofia Calvinista

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